segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O Doce Encanto do Começo.

Para quem pensar em se aventurar na arte de escrever, aqui vai um alento: Qualquer coisa que você imaginar em pensar para escrever sobre, pode ter certeza que alguém, em algum momento, já escreveu. E bem melhor do que você jamais fará. Portanto, não tente.
Em Vídeo
(um monólogo)


A cena começa com o Homem entrando e postando a câmera no meio da platéia. A seguir, ele liga a câmera e posta-se na cadeira começando a falar :


(Sentado olhando para a câmera)

Quando vocês já tiverem ouvido sobre mim, isso estará no vídeo. Quando tudo já tiver sido feito, é isso que vocês verão por último. Porque eu não consigo fazer isso pessoalmente, então estou gravando tudo isso antes de partir. Isso não é um testemunho. Isso é apenas um adeus. E eu não quero ficar dando explicações aqui, só quero que vocês tenham uma última lembrança de mim, uma lembrança boa talvez.

A você, minha mulher, eu desejo compreensão. A vocês, meus filhos, espero que não sintam raiva ou rancor de mim. Mas sei que isso tudo será difícil.
Não gostaria que vocês chorassem muito por mim, mas sei que é quase inevitável a dor, nem que seja mínima. Gostaria que vocês se lembrassem de mim pelas coisas boas e pelos momentos bons que tivemos. Por aquilo que fiz e por todas as minhas tentativas de fazer algo melhor, algo bom. Lembrem desse dia apenas como um dia bonito.

O dia está tão bonito. Um ótimo dia. Tão bonito que parece mais um presente que um dia. O céu azul, mas não está muito quente, o vento refresca e traz aquele ar de novidade, de coisa viva, de vida que dá vontade da gente rir e cantar uma música. Quando parece que você, de repente, simplesmente começa a entender todo o mistério da vida e toda a sua simplicidade e toda a sua imensidão e tem consciência de si e do papel que a gente tem na vida. E dá vontade de dar o melhor de si, de testar o limite e de ver até onde eu posso ir. Quando se esquece de todo o resto e só se quer respirar esse ar, esse ar que sopra vida e esperança de que tudo será melhor.

Não sei o que desejar a vocês, meus filhos. Acho que apenas sorte. Sim. Isso é o mais importante na vida. As pessoas tendem a subjugar o papel da sorte na vida, principalmente aquelas que são bem sucedidas. Elas têm o estranho hábito de desconsiderar a sorte, apenas para não diminuir o seu prestigio. Não admitem que sempre tiveram sorte, desde o início, desde a grande e maior loteria, a loteria do nascimento.

Nascemos sentenciados e tentamos obter o máximo que conseguimos com o que nos foi dado.

Eu não fui muito agraciado por essa loteria, mas não reclamo, não. Nunca tive nenhum impedimento muito grave na minha vida, como fome ou doença grave. Me virava com o que tinha a pesar de sempre desejar mais. Sei que tem gente pior do que eu que gostaria de estar onde estou e sei que gostaria de estar onde outros estão. Quando pequeno, eu sentia vergonha de não ter as mesmas coisas que as crianças que iam a escola comigo; sentia vergonha do meu velho pai ter sempre as mãos sujas e ásperas, enquanto os outros pais tinham as mãos macias e os dentes brancos e vestiam sempre roupas bonitas e cheiravam bem. Sentia vergonha da breguice da minha mãe que fazia de tudo para me deixar constrangido na frente dos outros, sem intenção é claro. E então o que eu mais desejava da vida era um dia ser rico e deixar tudo isso pra trás, deixar meus velhos pais bens de vida e esquecer deles. Esquecer da vergonha, do embaraço, da humilhação, do deslocamento, da sensação de falta de adequação.
E para mim, a forma de conseguir isso era ser sempre o melhor nas coisas que eu fazia. Não..., não necessariamente ser, mas buscar ser o melhor. E assim foi na escola e nos esportes. Nunca me destaquei tanto nos esportes, a pesar de uma vez eu ter ficado entre os cinco melhores nadadores do Estado de São Paulo da minha idade (acho que eu tinha uns 12 ou 13 anos). Mas eu nunca tive vontade de me dedicar mais aos esportes, apesar de sempre ter sido persistente. Eu sentia que meu caminho estava nos estudos. Era meio que uma obrigação para mim, uma dívida minha com meus pais por me proporcionarem algo que eles nunca tiveram (e eles sempre fizeram questão de deixar isso bem explicito!). E foi assim que eu descobri o mundo mágico que está nos livros. Todo o conhecimento que o homem já produziu ao alcance de todos aqueles que persistem. E a curiosidade que faz mover o homem. E a cultura que fala sobre tudo aquilo que a gente sente.
Para mim era simples: se eu me dedicasse e tirasse sempre boas notas meu futuro estaria garantido. Mas as coisas não funcionam assim. E é bem duro quando se perde uma ilusão, quando se nota a realidade, quando o mundo muda tendo permanecido o mesmo porque é você quem muda e enxerga diferente.

Meus pais sempre foram bem simples e bem mundanos: trabalhadores e religiosos e tradicionais e conservadores. Não sei quem foi que disse que o Brasil é um país engraçado porque o pobre destituído de qualquer propriedade é de direita. Bem... esses eram meus pais. A vergonha de antes progrediu para uma revolta que depois resultou em aceitação até que de fato pude assumir minha condição e abraçá-la.

Vamos morrer na classe em que nascemos, mas essa é a classe do nosso amor, do nosso coração.

Lembro da minha mãe de cabelos brancos, mas ainda jovem na carne, envelhecida como envelhecem os pobres, embora moça. Lembro do meu pai. Quando ficou cego, eu compreendi que um homem como ele, depois de anos e anos dando o seu melhor para conseguir as coisas, no final a única coisa que tem e com o que pode contar é a sua família mesmo que seja apenas mais uma fadada obrigação.

O que eu mais queria era ser livre. Livre pra fazer o que eu quisesse fazer quando eu quisesse fazer. Livre pra ser quem eu escolhesse ser. Sempre tive essa sensação de estar engaiolado. Um dia eu percebi que a liberdade não é um fim em si mesmo, mas é um caminho. É uma maneira de viver e perceber a vida. Mas mesmo assim, ainda não consigo ser livre. Não consigo me sentir realizado e eu sei como eu tentei. A minha idéia de liberdade era eu andando em um lugar bem alto, de onde dá pra ver as luzes da cidade. Com ela como vista eu estaria acompanhado das pessoas que eu mais gosto, cantando uma música de liberdade e uivando pra lua. E agradecendo a lua por nos dar a noite que nos dá os sonhos. Mas não consigo ser feliz assim também. Não consigo deixar de sentir essa tristeza que vem dos olhares tristes, que vem das risadas sem graça, que vem das conversas banais.

Não consigo competir com minha imaginação, com meus sonhos. Nunca nada é tão bom como nos meus sonhos. Todas as conquistas que obtive na vida tiveram esse gosto amargo de realização, essa vitória sem ter o que comemorar, sem explosão, sem plenitude.

Sempre tive vontade de voar. Voar para longe ou só voar.

Não serei lembrado pelo que fiz porque não fiz nada que merecesse ser lembrado. Não escrevi nenhum livro, não fiz nenhum filme ou peça, não descobri nada a não ser a minha constante tristeza.
Só serei lembrado por vocês e quando vocês forem, então serei esquecido para todo sempre e minha vida não terá significado nada em meio a toda essa imensidão.

Sabendo disso e de tudo mais que hoje eu sei..., não posso mais continuar. Não tenho mais as amarras morais ou ideológicas que me prendiam aqui.
E eu sei que sempre pensei muito em mim e me afastei das pessoas. E talvez por isso vocês podem pensar que eu não amo vocês, mas eu amo sim! Sempre! E muito! Por não saber exatamente o que é amor eu resolvi amar sempre tudo com o que me identifico, preferi amar demais a não amar. Mas nunca vi amor como uma amarra, sempre quis me libertar das amarras e não acho que amor seja mais uma. Ao contrário, amor é liberdade é deixar um homem sempre inquieto seguir seu rumo. E por isso tenho certeza que vocês me amarão sempre.

Adeus.

(Recolhe a câmera e dá um último olhar triste de baixo para cima para a platéia antes de sair)

FIM

domingo, 31 de agosto de 2008

Diálogo

- Nada a se fazer, não é? - É, nada a se fazer. - O que é que você gostaria de fazer? - Não sei. E você?- Não sei. - É. - Pois, é. - E então? - Então o quê? - O que a gente vai fazer hoje? - Como o que a gente vai fazer? A gente JÁ está fazendo. - O quê? - Relaxando. - Ah. - É. - Não é o mesmo de não fazer nada? - Não. É qualitativamente bem diverso. - Como? - Quando você não faz nada, isso implica que você não está nem relaxando. – Mas quando eu não faço nada eu não estou relaxando de alguma forma, não fazendo nada? – Não, quando você está relaxando, você está relaxando; quando você não está fazendo nada, você NEM relaxando está. – Mas e então como é não fazer nada? – É ficar parado vendo tudo acontecer na sua frente. – Mas é isso que eu estou fazendo agora! – Então, meus parabéns! – Mas você disse que eu estava relaxando! – Então você está relaxando, porra! Veja, não cabe a mim decidir o seu estado de ser em cada momento, se você quiser relaxar, relaxe, senão não faça nada. Você decide o seu grau de envolvimento nisso! – É isso aí. ... ... ... E você? O que é que tá fazendo agora? – Agora? – É, agora? – Eu tô curtindo o momento. – Isso é o mesmo que relaxar? – Pode ser. – E como é que é? – Curtir o momento? – É. – Ah, é bom, calmo, reconfortante, eu acho. – Acho que eu vou fazer isso. – Vai em frente. – Mas eu queria mesmo era relaxar. – Que diferença faz? Só escolha uma coisa e FAÇA! – Posso escolher não fazer nada? – NÃO! – Mas e por que não? – Porque fazer nada não é fazer, você tem que escolher uma coisa PRA FAZER. Como curtir, relaxar ou... dar milho aos pombos. – Não gosto de pombos. – Nem eu. – Malditos ratos com asas. – Malditos ratos com asas. – Prefiro cachorro. – É, cachorro é legal. – Sempre fica feliz por te ver e sempre te acolhe com a baba da lambida. – Se cachorro tivesse boceta, eu nunca mais teria que correr atrás de mulher nenhuma. – Verdade. – Num ia precisar fazer agrado que me custasse caro. Tudo o que o cachorro quer é um afago e comida e daí fica feliz da vida. – Malditas mulheres. – Malditas bocetas. – Malditos cachorros. – Quer mais uma cerveja? – Num precisa levantar não, deixa que eu pego dessa vez.

Ganso

Pelo aspecto fundamental da análise, vemos que o que se faz falta é o ganso. O mesmo ganso incômodo e intransitivo que permeava os nossos olhares e pensamentos em busca de algo que o fizesse acreditar que não seria apenas mais um pobre ganso, mas um penhor inigualável e esperançoso de parte do cedro podre e seco da minha viagem com o inescapável.

(uma idéia solta)

Forma e diferença estão em plena diagramação de estados complexos e difusos, imputando ao ser uma cadeia de pensamentos e bloqueios mentais próprios de quem vive e está em contato/isolamento com o mundo ao seu redor.

(O início de algo)

Ele olhava para o fundo, mas não conseguia enxergar nada. Nada além do escuro, nada além do fundo, nada além da imaginação. O que via era o que esperava ver e ter visto, era o interior de si mesmo oculto e rasgado ao mesmo tempo. Viu e não compreendeu. Porque se viu. No fundo, olhou pra dentro. Olhando pra dentro se perdeu como no mais obscuro abismo sem fundo.
E assim começou a sua saga, para entender o como e o porquê, para se encontrar e decifrar. E para trilhar o caminho para fora de si.
O que ele não sabia era que a sua jornada tinha sido programada para não ter um fim, não se cessar. Era uma jornada da busca do infinito pelo infinito. A epopéia do fim achado não como um fim, mas apenas como uma ponta que se emenda em outra - cobra que come o próprio rabo - que é o começo de nova jornada. A eterna estrada.Alguém já disse alguma vez que o que importa não é o destino final de um homem, mas o caminho que ele percorre até atingir o seu destino. O caminho que percorre trará todos os elementos que o farão homem. Tudo o que ele deve aprender, aprenderá pelo caminho. O destino não é um fim em si mesmo, o caminho é o meio, um meio que nunca se esgota. O destino é apenas uma pausa momentânea entre os caminhos. Assim como todo ponto final é apenas o início de uma nova frase