domingo, 10 de maio de 2009

Atrás da porta

Como eu quis abrir aquela porta. Aquela única porta que me levaria para vocês.
Podia ouvir vocês duas conversando, sentadas na escada do corredor.
Uma conversa baixa que o eco do corredor transformava em um ruído alto indefinível.
Eu queria saber sobre o que conversavam.
Sempre quis saber isso.
Seria sobre a impossibilidade do ser? Sobre a inexistência da felicidade autêntica? Sobre a eterna busca do amor verdadeiro? Sobre o sufocamento da existência?
Ou alguma outra teoria maluca de vocês?
Na minha cabeça imaginei como vocês estariam. Uma do lado da outra, ombros levemente encostados, pés virados para o centro, cotovelos apoiados nas pernas. Lindas.

Então alguém me chamou do lado de dentro e eu as perdi para sempre.
No apartamento estávamos apenas matando o tempo.
Todos nós e a outra.
Nunca fui apaixonado pela outra.
Foi apenas o desespero. Foi um momento. Foi por não saber o que fazer.
Não foi especial, como teria sido com vocês. Estraguei tudo, eu pensei.
E agora estamos tão distantes.
Vocês desapareceram. Como disseram que fariam.
Não passamos de ilustres desconhecidos. Nós três.
Um momento, e tudo muda. Tudo se transforma para sempre.

Fecho os olhos e me transporto para aquele momento.
Aquele exato instante.
Eu estou com meu ouvido encostado na porta e escuto suas vozes do lado de fora.
Eu levo a mão à fechadura. Seguro a chave e giro.
Eu estava apaixonado por vocês.
Estupidamente apaixonado.
E eu queria tanto dizer que tudo ia ficar bem, agora que tínhamos uns aos outros.
Que não tínhamos que sofrer mais por que havíamos nos encontrado nessa vida.
E isso era uma tremenda de uma sorte.

Agora estou aqui, escutando Stooges e escrevendo tudo isso.
Lembra quando eles eram a coisa mais genial que já tínhamos ouvido?
Lembra quando queríamos ser como o Iggy Pop? Inconseqüente até a última gota do espírito.
E nos esforçávamos para chegar lá.
Tento voltar no tempo com tudo isso, eu acho. Para uma época onde a esperança era apenas uma criança brincalhona. Onde tudo poderia ser feito. Onde tudo era novo e a vida tinha sabor de vinho tinto.
Gostaria de voltar no tempo e mudar tudo. Sempre é assim com os meus erros.
Esse negócio de não olhar para trás e não se arrepender dos erros é pura merda. Bobagem rasteira de algum idiota que quer se passar por alguém melhor do que ele realmente é.

Uma porta.
Eu a abriria e veria vocês duas, sentadinhas, conversando. Lindas.
Então, eu iria até vocês. Eu me colocaria entre as duas.
Meus braços quentes esquentariam os seus braços. Os pelos se arrepiariam.
Acariciaria os seus cabelos. Com as costas da mão sentiria a doce pele das suas faces.
Olharia nos seus olhos.
Registraria esse momento na minha memória para sempre.
E pediria a toda a sorte dos céus que de lá ninguém pudesse me tirar. Nunca.

Estou com meus olhos fechados.
Não desejo abri-los agora.